Filipe Salgueiro fala dos 10 anos da comédia “MÉNAGE” e o seu Legado
"O Teatro muda a vida das pessoas!"
Ator de teatro, de televisão, cinema e modelo, Filipe Salgueiro, artista multifacetado, batalhador, persistente, dedicado e sempre com uma boa disposição e simpatia contagiante, está no leque dos atores portugueses da nova geração mais acarinhados pelo público.
Encenador e diretor de Atores, com um espírito desafiador, fala do sucesso inesperado do seu espetáculo mais mordaz!
Celebrar 10 anos com 10 perguntas ao ator e encenador deste espetáculo!
“Ménage – Vais Dizer Que Não Gostas?” é um sucesso que conta com 10 anos em palco o que torna este projecto como um dos maiores sucessos da sua carreira como encenador e ator que foi estreado em 2014 em auditórios e presentemente em 2024 celebra essa longevidade. Surpreendido? Falamos de um legado…
O Estórias Magazine esteve à conversa com o ator para conhecer todos os detalhes do seu mais recente espetáculo que acaba por ser um regresso às origens, um revivalismo algo bem incomum no Teatro nacional que transformou este espetáculo num legado a ser estudado na comédia nacional!
Um espetáculo descomplexado
Como e porque surgiu a comédia “Ménage – Vais Dizer que não gostas?”
A comédia “Ménage” nasceu da necessidade de fazer as pessoas rirem, rirem com vontade, esquecerem os problemas no exterior do Teatro, sem grandes conceitos por detrás do show, mas que fosse direcionada aos adultos, falando de temas adultos, mas que as pessoas se revissem em cada cena. é transversal, temos velhos e novos no público a rirem do mesmo. É contemporâneo mas respeita o passado e futurista ao mesmo tempo, é uma “salada”.
É um espetáculo descomplexado, sem tabus e quando estreou em 2014 nunca pensei que em 2024 fosse tão importante e significativo. Temos sketchs que existem desde o primeiro show e temos pessoas no público que viram o primeiro espetáculo e continuam a regressar e trazer amigos. É um espetáculo camaleônico que muda e se reinventa constantemente e a sua energia frenética encanta todos aqueles que vão assistir.
É contudo um show que “não pede licença” é “bruto” e por vezes “ácido”, tem personalidade e “pêlo na venta” e não pretende ser encantador mas encanta e acho que é isso que seduz o público. Esse impacto. Assistimos à necessidade cada vez maior do Teatro no geral em não querer ser perturbante ou “picar” o espetador com medo de este ficar ofendido e não regressar, mas na verdade o que quis fazer com este espetáculo é o contrário, mexe com os dogmas e os preconceitos do espetador sendo o palco o ponto de partilha de tudo. É catalisador.
Teatro Interativo
Como surgem estes espetáculos? São histórias que observa nos fatos do dia a dia ou andam a bailar na sua cabeça e um dia tira da gaveta?
Sim, são histórias e clichês do dia à dia! E quanto mais simples é o cliché mais é entendido pelo público e mais colado na cena fica o espetador. É Teatro interativo e de improviso sendo o terceiro elemento desta “Ménage” o público. Levamos para a cama o público. Anteriormente o espetáculo era sempre feito com 2 atores, eu Filipe Salgueiro e Maria Giestas em palco e o terceiro elemento seria sempre um convidado da área artística que poderia fazer vários shows connosco, artistas reconhecidos pelo público ou atores em início de carreira que avaliados pela nossa equipa eram confrontados com este desafio. Este último ano apostámos em celebrar estes 10 anos em que o terceiro elemento seria o público aleatório e muito desafiador. O maior encanto é ver as pessoas que sobem a palco sem qualquer experiência confiarem em nós e deixarem-se levar nas cenas loucas e hilariantes que acontecem no palco. É fantástico a receptividade e a entrega de todos os que partilham a cena conosco!
O projeto
Quantas pessoas estão envolvidas no projeto e como é feita a preparação dos espetáculos?
Existe uma equipa de produção por trás que trata de tudo e uma ligação de anos impossível de simular entre mim e a Maria Giestas, pois confiamos nessa magia que alimenta a cena. Por vezes existem cenas que apenas são um esqueleto ou meia dúzia de palavras que “não sabem a nada” no ensaio e só ganham forma, força e “sabor” quando tudo está a acontecer. Como um bom cozinhado feito pela nossa mãe. Na hora certa, no tempo certo, com o público certo e no timing certo. Como isso acontece? Não sei, é mágico!
A cumplicidade do público
Esta comédia está em cena há 10 anos, com diversas tours por Portugal. Como tem sido recebida pelo público?
A recepção tem sido fantástica. Adoramos levar Teatro a sítios muitas das vezes que não são visitados pelas companhias de Teatro ou até a locais que não recebem espetáculos como o nosso. São 10 anos de histórias e afetos, este espetáculo está cheio de histórias e momentos únicos, o curioso é falar de alguns deles e o público recordar conosco esses momentos, pois ele estava lá. Não existe “quarta parede” neste show nem durante o próprio espetáculo nem depois dele. As personagens são acarinhadas e levadas para a vida de quem vem ver o show. Isto é a maior dádiva do Teatro.
O êxito, os prémios e as distinções
Sabemos que o espetáculo já mereceu vários prémios e distinções, é importante esse reconhecimento?
Sim em parte é. Claro que sim. Mas nunca foi um espetáculo que fosse concebido a pensar nos prémios que poderia receber, o maior dos prémios são 10 anos em cena e acima de tudo recebermos mensagens e videos dos espetadores a copiarem as personagens do show na sua vida normal ou os agradecimentos por “lavarmos a Alma” a todos aqueles que riram com vontade ao verem o espetáculo. O Teatro muda a vida das pessoas! Temos pessoas que já viram este show 20 vezes e não estou a exagerar!
O segredo do sucesso
Os cabeças de cartaz são o Filipe e a Maria Giestas. Não é fácil cativar o público da maneira que o têm feito, com salas sempre esgotas. Qual é o vosso segredo?
O maior segredo é sermos genuínos, respeitamos muito o Teatro e as “tábuas” que pisamos, um amor gigante pelo público e a magia que sabemos que criamos ali no Teatro. É uma celebração da vida, uma celebração do Teatro, estamos ali com o público e aquela energia contagiante que transborda e alimenta todos. O segredo é esse, não existe segredo, mas existe muito Amor e esse Amor contagia!
O espetáculo…o conteúdo…o improviso
O espirito em cada sessão é o improviso, o mote é o sarcasmo e muitas pitadas de malícia. Porquê esta concepção de espetáculo?
Acima de tudo fomos beber inspiração à verdadeira e boa revista à portuguesa, ao fado vádio e ao que ele representa na vida das pessoas, às conversas bairristas e trazer toda essa mecânica para uma roupagem mais urbana e moderna, misturar todas essas referências com a geração Madonna e uma linguagem videoclip, é uma “salada” e uma “salganhada” que funciona, as pessoas entendem, as pessoas reveem amigos, família, conhecidos no palco e muitas das vezes riem delas próprias sem tabus. É uma comédia cheia de clichês, mas a nossa vida é feita de clichês e abraçamos isso com gosto e sarcasmo.
Agora imaginem em pleno 2014 ter uma cama em palco, falar de sexo e relações humanas tudo misturado com música e personagens frenéticas… Foi desafiador! Não é uma comédia para rir um bocadinho, ou se gosta ou não se gosta! Na verdade são 10 anos de muitas gargalhadas e de pessoas que “dobram o riso” de tanto rir! É exorcizar os demónios do corpo! Eu e a Giestas fazemos dezenas de personagens e a transformação de cada personagem é gigante desde maquilhagem e caracterização, figurinos e a frescura da cena é dada com o improviso, é tudo real e no local e isso estimula o público que sente o “sangue a ferver” e vai nesta viagem conosco!
Um espetáculo “que se supera e surpreende constantamente”
Neste “Ménage – Vais Dizer que não gostas?” o tema é o “Sexo dos Anjos” e as diferenças entre homens e mulheres. É um tema que continua na ordem do dia no decorrer destes 10 anos em cena?
Uma das grandes apostas deste espetáculo foi ele tentar sempre se superar e surpreender constantemente e nessa evolução também testemunhamos nos sketchs essa transformação como por exemplo o maior crescimento da importância digital nas relações entre humanos.
Essas diferenças são muito hilariantes, fazem de nós seres complexos e alguns de nós complicados. A comédia adora pessoas complicadas! Numa altura em que investimos cada vez mais na Inteligência Artificial e na Era digital nunca as relações humanas estiveram tanto na ordem do dia. O Teatro é a única Arte feita de Humanos para Humanos, para ser entendida por Humanos.
As dezenas de personagens
O Filipe e a Maria desdobram-se em palco em dezenas de personagens e desafiam os espetadores a contracenar convosco. Qual a reação do espetador quando o envolvem na ação e no espetáculo?
Posso dizer que foi uma aposta ganha e que estávamos muito intrigados nos primeiros shows como iria ser… A verdade é que ficámos e cada vez mais estamos surpresos com o empenho do público nas cenas e sketchs quando é abordado para subir a palco. A convição, o empenho, a alegria de estar ali conosco na cena e todos os outros a assistir é a maior celebração do Teatro, trazer o espetador para a cena conosco e posso adiantar que cada vez temos desafiado mais quem está na cadeira do Teatro a assistir.
Gerir uma pessoa desconhecida em palco numa cena implica muita confiança e foco da nossa parte para transformar tudo o que acontecer em algo hilariante e de valor cénico e acredito que o público entende isso, mas também acredito que isso acontece porque desde o primeiro momento em que o espetáculo começa todos entram neste universo e ninguém quer sair, atores, público e equipa. Somos todos uma única celebração!
Quando o Mundo pára
Um amigo meu , que assistiu a um dos espetáculos comentou: “É a loucura completa, mas saímos de lá renovados, divertidos. Enquanto lá estamos as tretas cá fora não existem. Acho que nunca ri tanto na minha vida”. Como se sente com a afirmação deste espetador?
É para nós a maior dádiva, é por isso que este show existe, não pretende ser moralista ou ensinar nada a ninguém, mas ensina… Ensina a rir de nós próprios e dos outros, que a Vida deve ser celebrada e partilhada e que esse ponto, momento comum é ali… Como uma celebração religiosa, um ato divino… O Mundo pára naquele momento e somos nós todos juntos que exorcisamos maleitas com o riso… Desculpem as referências mas desde que temos um Padre e uma Freira no espetáculo como novas personagens que têm feito as delícias do público é inevitável!
Qual vai ser o próximo nível?
Com convidados que em conjunto com os atores ajudam a recriar o quotidiano dos “comuns mortais”, que promete ser frenético e envolvente, um “tudo ao molho e fé em Deus”, o “Ménage – Vais Dizer que não gostas?” só pode voltar a ser um sucesso de bilheteira e casa esgotada.
A promessa de celebrar 10 anos em cena está cumprida. Devido ao sucesso Filipe Salgueiro fala “do próximo nível” do espetáculo e questionado “fecha-se em copas” ou por outras palavras “mais não diz”, mas promete regressar à estrada com este espetáculo, o qual futuramente vai ter um novo legado que respeita a história do próprio espetáculo.